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A dependência quase exclusiva do transporte rodoviário no escoamento de grãos no Brasil tem gerado preocupações entre especialistas e lideranças do setor agropecuário. Durante reunião da Comissão Nacional de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), realizada em 19 de novembro, foi destacado que 96% da produção de grãos no país é transportada por caminhões. Essa concentração inédita no cenário global revela os desafios logísticos enfrentados pelo agronegócio brasileiro, que precisa equilibrar a crescente produção com uma infraestrutura insuficiente.
Na safra passada, quando o Brasil atingiu a marca de 322 milhões de toneladas de grãos, foram necessárias mais de 10 milhões de viagens de caminhão para atender à demanda. De acordo com Thiago Guilherme Péra, coordenador do Esalq-Log, a participação do transporte rodoviário cresceu de 44,7% em 2010 para 54,2% em 2023. Enquanto isso, ferrovias e hidrovias avançaram em um ritmo muito mais lento, agravando os gargalos logísticos do país.
Distância e Competitividade Internacional
Um dos fatores que impactam diretamente a competitividade brasileira é a distância média entre fazendas e portos. No Brasil, essa distância é de 625 km, enquanto nos Estados Unidos, um dos principais concorrentes no mercado internacional, é de apenas 80 km. Essa disparidade aumenta os custos logísticos e reduz a margem de lucro dos produtores brasileiros, dificultando a competição com outras potências agrícolas.
Soluções e Investimentos Necessários
Diante desse cenário, especialistas têm apontado a necessidade de diversificação na matriz de transporte de grãos. A assessora técnica da CNA, Elisangela Pereira Lopes, destacou a importância do projeto Ferrogrão, que promete melhorar a logística no Arco Norte, reduzindo a dependência de caminhões. Além disso, o fortalecimento das hidrovias e a utilização de portos modernos, como o complexo do Porto do Açu, no Rio de Janeiro, foram apresentados como alternativas estratégicas.
As hidrovias, embora ainda subutilizadas, demonstraram crescimento no Arco Norte e podem ser uma solução viável para desafogar as rodovias. A integração de diferentes modais de transporte é vista como indispensável para reduzir os custos logísticos e aumentar a eficiência no escoamento da produção.
Impactos Regionais
A dependência do transporte rodoviário não afeta todas as regiões do Brasil de maneira uniforme. Estados como Minas Gerais e Bahia apresentaram dinâmicas logísticas distintas. Minas Gerais, por exemplo, registrou recordes de exportação e integração eficiente entre o transporte de grãos e fertilizantes. Já na Bahia, houve variações significativas: enquanto Irecê registrou aumento no transporte de grãos, Barreiras apresentou queda e Paripiranga manteve estabilidade seguida de recuo.
No Distrito Federal e em estados como Mato Grosso, o transporte rodoviário continua dominante. Em Mato Grosso, a lentidão na comercialização de soja e milho, combinada com altos estoques de milho, sustenta a previsão de que a dependência rodoviária continuará nos próximos meses.
Planejamento Logístico como Prioridade
Para Isan Rezende, presidente do Instituto do Agronegócio (IA), a situação evidencia a urgência de investimentos em infraestrutura multimodal. “A dependência de caminhões para transportar 96% dos grãos no mercado doméstico é uma realidade que não se vê em outras potências agrícolas. Isso gera custos elevados e desafios operacionais, comprometendo nossa competitividade no mercado global”, afirmou Rezende.
Segundo ele, o planejamento logístico deve incluir investimentos em ferrovias e hidrovias, que são indispensáveis para acompanhar o ritmo de crescimento do agronegócio brasileiro. A integração de diferentes modais é essencial para reduzir gargalos logísticos, melhorar a eficiência do escoamento e sustentar o crescimento do setor.
Futuro do Transporte de Grãos no Brasil
Com a produção agrícola em constante expansão, a dependência quase exclusiva do transporte rodoviário se torna um problema cada vez mais crítico. Superar essa limitação exige não apenas investimentos em infraestrutura, mas também um planejamento estratégico que integre diferentes soluções logísticas.
A implementação de projetos como a Ferrogrão e o fortalecimento das hidrovias são passos fundamentais para assegurar que o agronegócio brasileiro permaneça competitivo em um mercado internacional altamente disputado. Para tanto, é indispensável a colaboração entre o setor público e privado, garantindo que a logística acompanhe o ritmo acelerado do crescimento da produção agrícola no Brasil.
Em um cenário onde o Brasil se consolida como um dos maiores produtores de grãos do mundo, enfrentar os desafios logísticos será crucial para manter sua relevância global e evitar que os custos de transporte comprometam o potencial do setor.